A Justiça Federal do Paraná sentenciou, nesta quinta-feira (10), Francisley Valdevino da Silva, conhecido como Sheik dos bitcoins, sua mãe e seus cúmplices em um dos maiores casos de fraude envolvendo criptomoedas no Brasil.
O grupo operava por meio das empresas FORCOUNT e INTERGALAXY e foi condenado por organização criminosa, lavagem de dinheiro e fraude contra milhares de investidores, prometendo altos retornos em investimentos que, na realidade, escondiam um esquema de pirâmide financeira.
Estima-se que as vítimas tenham perdido cerca de R$ 4 bilhões, sendo que parte dos valores foi desviada para aquisição de imóveis de luxo e bens no Brasil e no exterior.
O esquema foi desmantelado após uma investigação iniciada em cooperação com a Homeland Security dos Estados Unidos, que havia recebido denúncias de vítimas americanas.
A operação identificou que os investidores eram atraídos com promessas de retornos diários de até 2,8% e a possibilidade de dobrar os investimentos em poucos meses.
Para dar uma aparência de legalidade ao esquema, as vítimas tinham acesso a uma plataforma online que exibia extratos falsos, dando a impressão de que os investimentos estavam valorizando.
No entanto, grande parte do dinheiro enviado pelos investidores era desviado para contas pessoais dos integrantes da organização criminosa.
Sheik dos bitcoins é condenado a 56 anos de prisão, mãe pega 42 anos e justiça manda investigar pastor Silas Malafaia
Francisley Valdevino da Silva, apontado como líder do grupo, utilizava sua influência em comunidades religiosas e seu carisma em palestras para cooptar novos investidores.
A sentença que o Livecoins obteve acesso menciona que o Sheik dos Bitcoins utilizou a imagem do pastor Silas Malafaia para atrair investidores ao seu esquema fraudulento.
Segundo o documento, as empresas e franquias associadas ao Sheik faziam uso da imagem de Silas Malafaia para promover planos de aluguel de criptomoedas. Tal estratégia de marketing visava cooptar investidores, especialmente do público evangélico, o que facilitava a atração de pessoas que confiavam na imagem do pastor.
Contudo, não há indicação de que Silas Malafaia tivesse envolvimento direto no esquema, mas sim que sua imagem foi explorada de forma estratégica para conferir credibilidade às promessas de investimento feitas pelo grupo.
No entanto, a sentença menciona que houve uma transferência de R$ 18 milhões para o pastor, conforme registrado em uma petição relacionada ao processo. A Justiça determinou que a Polícia Federal investigue as circunstâncias dessa transferência, buscando esclarecer os motivos e a relação com o esquema criminoso liderado pelo Sheik.
Esse valor teria sido parte de um investimento em um negócio envolvendo a venda de artigos religiosos por meio de um marketplace, mas a decisão de devolução desses valores ou a sua destinação depende dos desdobramentos dessa investigação.
- O pastor foi procurado para comentar o caso. A matéria será atualizado com posicionamento.
Muitos dos aliciados eram pessoas sem experiência no mercado financeiro, que viam nas promessas do grupo uma chance de multiplicar suas economias. O esquema chegou a envolver mais de 15 mil vítimas, tanto no Brasil quanto no exterior, e causou prejuízos irreparáveis, incluindo a perda de todas as economias de vida de algumas pessoas.
A decisão judicial reforça que a pena aplicada levou em conta a elevada reprovabilidade das ações dos acusados, que utilizavam métodos sofisticados para ocultar a origem ilícita dos valores.
Francisley, por exemplo, abria várias empresas para diluir suas responsabilidades, promovia eventos em diversos países e ostentava uma vida de luxo, utilizando o dinheiro das vítimas para adquirir vinícolas, hotéis, e imóveis de alto valor.
A estrutura do esquema envolvia diferentes etapas, desde a captação inicial dos clientes até a criação de criptomoedas sem liquidez, as famosas “shitcoins”, que eram apresentadas como oportunidades de alto retorno.
Quando as vítimas tentavam sacar seus recursos, encontravam dificuldades e justificativas para os atrasos nos pagamentos, como auditorias inexistentes ou bloqueios de contas. Em situações em que as queixas se tornavam mais ameaçadoras para o esquema, Francisley oferecia acordos parciais para acalmar os investidores e evitar denúncias às autoridades.
Além da condenação por organização criminosa e lavagem de dinheiro, a Justiça determinou o confisco de todos os bens adquiridos com os recursos desviados e o pagamento de multas proporcionais aos valores movimentados.
A pena aplicada a Francisley soma mais de 56 anos de reclusão, com o agravante da transnacionalidade do crime, uma vez que o esquema também atuava nos Estados Unidos, onde parte das denúncias teve origem.
Sendo assim, além dos 56 anos de prisão, a sentença prevê multas e o confisco de bens adquiridos com os recursos desviados, incluindo imóveis e objetos de luxo comprados com o dinheiro das vítimas.
A Justiça também determinou que Francisley e os demais réus sejam responsabilizados pela reparação dos danos financeiros causados, que podem ultrapassar R$ 1 bilhão.
Os outros envolvidos no esquema, como Alan Siqueira Garbes Luciano, Ranieri Augusto Ferrari, Claudete Ribeiro Chagas Proencio (mãe de Francisley), André Luis de Almeida Martins e Rauny Pedro Ribeiro Chagas Proencio, também foram condenados por participação na organização criminosa e por lavagem de dinheiro, com penas que variam conforme o grau de envolvimento de cada um.
Claudete Ribeiro Chagas Proencio, mãe de Francisley, foi condenada a 42 anos, 11 meses e 20 dias de reclusão por sua participação no esquema criminoso.
A Justiça Federal considerou que, apesar de não ser a líder do grupo, Claudete teve um papel relevante no esquema de lavagem de dinheiro e na administração das empresas envolvidas, atuando de forma consciente para ajudar a ocultar os recursos obtidos de maneira ilícita.
Além da pena de prisão, ela foi condenada ao pagamento de 1.760 dias-multa, com cada dia-multa fixado em dois salários mínimos, levando em conta o montante movimentado pela organização criminosa.
A sentença destacou a colaboração de Claudete em ações que ajudaram a dar uma aparência de legalidade ao esquema, contribuindo para o aliciamento de novas vítimas e a manutenção do golpe.
A lista dos réus condenados e suas respectivas sentenças conforme a decisão judicial:
- Francisley Valdevino da Silva: Condenado a 56 anos, 4 meses e 10 dias de reclusão em regime inicial fechado, além de uma multa de 2.689 dias-multa, com cada dia-multa avaliado em cinco salários mínimos .
- Claudete Ribeiro Chagas Proencio: Condenada a 42 anos, 11 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, além de uma multa de 1.760 dias-multa, com cada dia-multa fixado em dois salários mínimos .
- Alan Siqueira Garbes Luciano: Condenado a 48 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, além de uma multa de 2.187 dias-multa, com cada dia-multa no valor de dois salários mínimos .
- Ranieri Augusto Ferrari: Condenado a 31 anos e 11 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e multa de 1.400 dias-multa, sendo o valor unitário de um salário mínimo por dia-multa .
- Rauny Pedro Ribeiro Chagas Proencio: Condenado a 31 anos e 11 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e multa de 1.400 dias-multa, com cada dia-multa fixado em um salário mínimo .
- André Luis de Almeida Martins: Condenado a 11 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicial fechado, além de uma multa de 280 dias-multa, com cada dia-multa fixado em dois salários mínimos .
Impacto nas vítimas e desdobramentos
As consequências do esquema foram devastadoras para as vítimas. Muitas perderam todas as suas economias e enfrentam sérios danos psicológicos, além de conflitos familiares, uma vez que, em alguns casos, convenceram parentes e amigos a também investirem no esquema.
A investigação, conduzida pela Polícia Federal em parceria com as autoridades norte-americanas, revelou um complexo sistema de movimentações financeiras e uso de contas em mais de 80 empresas, com o objetivo de mascarar a origem dos recursos.
Relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) indicam que, além dos valores em criptomoedas, o grupo movimentou cerca de R$ 4 bilhões apenas no sistema bancário oficial entre 2018 e 2022.
As autoridades continuam a trabalhar para identificar outros envolvidos no esquema e recuperar parte dos valores desviados. No entanto, para muitos dos lesados, a recuperação dos recursos perdidos permanece incerta, deixando um rastro de frustração e prejuízos que deve perdurar por anos.
*Matéria em desenvolvimento.